De um blog que sempre sigo, recolho este texto muito interessante. Mesmo depois da "Semana Santa". Leia.
Teve “Garota Safada” na Semana Santa de Pernambuco
Ronaldo Correa de Brito
Vi
o outdoor convidando para a Semana Santa de Gravatá, uma cidade serrana
de Pernambuco, bem próxima ao Recife, onde a maioria das pessoas ricas
possui casa. Houve tempo em que Gravatá esfriava, chegando aos 16 graus
(acima de zero, é claro), nos meses de junho, julho e agosto. Os
visitantes usavam casaco e botas, como se estivessem na Serra Gaúcha.
Por
lá existem casas de coberta inclinada, como se fosse cair uma nevasca,
igual na Dinamarca ou Suécia. De longe, se avista os telhados
escandinavos, debaixo do sol quente. As propagandas convidam os turistas
a curtir o clima serrano e as delícias do campo. O clima ainda é
agreste, mas o campo… A especulação imobiliária transformou a cidade num
amontoado de condomínios e vilas.
Viaja-se a Gravatá para curtir um
churrasco com os vizinhos, ouvir som brega e de forró, ou comer fondue
se imaginando na Suíça.
O turismo é sempre enganoso, em
qualquer lugar do mundo. O importante é que o turista faça sempre a
mesma coisa, visite os mesmos lugares, sinta as mesmas emoções,
fotografe e filme as mesmas imagens. E depois reúna parentes e amigos
(coitados!) em casa, e mostre o enfadonho resultado da viagem. Afinal,
viaja-se para quê? Para filmar e fotografar e trazer a prova aos
incrédulos.
Em Gravatá existe uma grande programação de
Páscoa, já ia esquecendo. Não pensem que se trata de vigílias nas
igrejas, jejuns, penitências, procissão do Senhor Morto, Missa de
Aleluia. Nas rádios e televisões a voz do locutor convoca as pessoas da
seguinte maneira: “Semana Santa em Gravatá!
Não perca os mega shows de
“Forró da Pegação”, “Garota Safada”, “Cavaleiros do Forró”, “Zezé de
Camargo e Luciano”… Venha curtir e se divertir! Apoio”… Segue-se o nome
de uma cerveja.
Cristo nunca apareceu para expulsar os
vendilhões do templo. Ou propor que acabassem a esbórnia, usando o
calendário religioso para farras. A França avançou bastante ao impor o
fim dessas hipocrisias. Mantenham os feriados – nada contra o descanso
de ninguém –, mas não em nome de Jesus ou de um cristianismo que poucos
praticam. Mal saímos de um Carnaval que dura dois meses – o caso do
Recife, Olinda e Salvador –, e lá vem um segundo tempo. Poderiam chamar a
zorra de “Carnaval 2, o retorno”, ao invés de Semana Santa. Empresas e
secretarias de turismo dessacralizaram os rituais da Paixão e no lugar
deles criaram mais um carnaval, com o intuito de atrair multidões,
faturar dinheiro e – tem sempre essa conversa de fariseu – gerar
empregos.
A maior vocação do povo brasileiro é mesmo o
carnaval. Depois que as festas brasileiras se transformaram em grandes
negócios para vender cerveja e cantores de brega, pagode, axé e forró, o
calendário se confundiu e ninguém distingue mais Natal, São João,
Semana Santa e Carnaval. O cenário é sempre o mesmo: um palco gigantesco
ou um trio elétrico, iluminação feérica, som de estourar ouvidos e
muita, muita cerveja.
E lucro, a única medida para o nosso tempo, não importando o custo.
Quando
se tentou aprovar no senado e na câmara uma lei que proibisse a
propaganda de álcool (cerveja, principalmente), as empresas de
publicidade comandaram um levante geral, alegando que estavam cerceando a
liberdade de imprensa, de livre expressão e por aí afora. Qual o quê!
Defendiam a liberdade de encher os bolsos de dinheiro, não importando o
mal que fazem aos jovens e às mulheres, os mais fragilizados pelas
campanhas aliciantes.
Eita! Falo como um profeta bíblico,
clamando no deserto. Bem que gostaria de fazer chover fogo. Mas não
tenho poder nenhum, a não ser o de escrever nesse blog.
É
claro que não interessa a ninguém pensar seriamente no quanto se
tornaram falsas as comemorações religiosas. Não interessa à Igreja, pois
ela perderia prestígio e poder. Nem aos fieis verdadeiros. Nem aos
laicos, que desejam os feriados para descanso. Nem à indústria da
diversão, pelos prejuízos que isso acarretaria. Nem aos fabricantes de
bebidas, os fariseus barrigudos. Em suma: deixa como está.
E
vamos ao “Forró da Pegação”, na Quinta-Feira da Ceia Larga, e ao show
da “Garota Safada”, na Sexta- Feira da Paixão. Encham a cara e dancem à
vontade. É tudo pago pela Prefeitura.
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